Se eu gostei
de ti?
A resposta é
tanto que teria sido necessário inventarem-se novas palavras
quem sabe
uma nova língua,
para que
não caíssemos na vulgaridade dos significados que diariamente usamos
na doce
tentativa de se dizerem coisas bonitas uns aos outros.
Gostei tanto
de ti que de ti não me afastei nem um segundo
Vivi sempre com
o medo de que me pudesses escapar
e que nos pudéssemos
perder de vista,
mesmo
sabendo que, por vezes, teria sido bom se nos tivéssemos distanciado,
tal o
cansaço que em ti provocava.
Gostei não
só de ti, como de cada vez que gostei, gostei ainda mais de ti
porque me acompanhaste
desde sempre
e porque me
convenci que seguiríamos de braço dado desde então até ao fim dos meus dias
mesmo quando
me recusavas, por vezes, a tua presença,
mesmo assim,
tal como eu, sabias que sem mim não sobreviverias também.
Se gostei de
ti?
Tanto,
tanto… que não chegaram os dias para te ter transmitido o quanto
ainda que a
minha existência se tenha prolongado anos e anos
e que juntos
tenhamos partilhado tanto, a cada momento
ainda que
por vezes tenhas fingido que apenas tinhas ouvido falar de mim
e que não te
interessava verdadeiramente o que eu pudesse estar a fazer ou a sentir,
porque isso foi
sempre uma preocupação menor.
Não importa,
gostei de ti, sempre…
Assim desta
forma, assim como tu sempre foste…
Às vezes olhava-te
e pensava…
Porque havia
eu de gostar de ti? Antes, porque gostava eu de ti?
Era apenas
uma forma diferente de me colocar a questão.
No entanto,
se assim era na verdade, não queria obter, nem sequer precisava duma resposta.
Tratava-se apenas
de um estímulo para me fazer pensar, sentir, voar…
e quedava-me
com as minhas dúvidas, com a minha pergunta maior…
Se gostava
de ti!?... De ti quem?
Ah, é tão
redutor falar tão só de alguém!... Quando tu eras tanta gente…
Quando tu e
eu fomos… tantos e tão poucos
Sim, gostava
de ti quando te lembravas de mim,
quando me
fazias sorrir e respirar também,
quando acordava
pela manhã, e o teu olhar me desejava um bom dia.
Gostava de
ti quando me procuravas e querias estar comigo,
quando não
me abandonavas e sentia que vivias em mim,
que me
acompanhavas e sofrias quando me encontrava fraco,
exultavas ao
ver-me alegre e partilhavas cada dor e cada alegria
com vontade
de repetir as emoções enquanto respirássemos o mesmo ar.
Também gostava
de ti quando me rejeitavas e me obrigavas a pensar
que assim era
porque tinhas medo de te entregar
ao doce
encanto dos dias em que o que contava era a memória da pele,
que quando
te afastavas, desejava-te na justa medida da espera que te traria de volta
e que juntos
brindaríamos ao momento do reencontro.
Gostei de ti
porque me habituei a gostar…
uma vez que
sempre te conheci
e a cada
instante que passava podia adivinhar o que vinha a seguir
porque me
conhecias também.
Gostei tanto
de ti que às vezes pensei que tal sentimento bastava
e que o
melhor mesmo era separarmo-nos e cada um de nós poder seguir o seu rumo
mesmo sabendo
que tal desfecho seria impossível
tal a
dependência um do outro.
Gostei
tanto, mas tanto de ti, porque tu foste tanta gente…
E nunca me
cobraste, nem me tiraste nada, porque sabias que com o passar dos anos
tudo tornaria
aos seus divinos lugares,
que o
equilíbrio apenas existia se tu e eu existíssemos
e que quando
um de nós faltasse, o outro adormeceria para sempre.
Gostei de ti
quando me odiaste e me fizeste sentir insignificante
quando me
mostravas que eu não era eu, que apenas nós fazíamos sentido
que o
desprezo com que me brindavas
era apenas para
me fazeres entender o quanto te maltratava
ao longo dos
anos que se repetiram iguaizinhos,
e durante os
quais o desfile de personagens que me encantavam e te desencantavam
deram em
nada.
Gostei
sempre de ti, à noite, quando a noite chegava…
E era à
noite que te adorava… e te enganava…
A ti e a
tanta gente…
E que me
enganava a mim também…
Quando te deitavas
comigo e me pegavas na mão
fazendo-me
descobrir o meu corpo através de sonhos previamente encomendados
que me levavam
ao Éden e me traziam de volta, a ti, pela manhã
quando descobria
que tínhamos mais um dia pela frente para partilharmos.
Ahh!... E o
quanto foi bom teres gostado de mim também…
Sim, não
posso esquecer…
nos dias
tristes em que perdi tudo…
Todos
aqueles de quem eu mais gostei
A minha mãe,
o meu pai, os meus tios, os meus avós… os meus amigos
Deste-me
força e fizeste-me sempre acreditar que um dia nos reencontraríamos
Os amores
que perdi e os que sem querer perdi também
E que não
reencontrarei jamais
Sim, foste
tu que me deste a mão e me levaste de novo à festa
Foste tu que
me fizeste sentir que vale a pena prosseguir
E que a
determinado momento voltar-me-ia a ser dada a oportunidade de reviver
o que é a
alegria, o reencontro de amigos, a redescoberta de alguns prazeres…
E que hoje,
perto do fim da linha, insistes em me fazer sorrir tranquilo
E hoje, hoje
estas palavras são-te dedicadas
A ti que eu
maltratei…
Foste na verdade a
minha verdadeira companheira
Aquela que
me aceitou como eu sou
E que por isso
foste a única a quem eu fui sempre fiel e olhei sempre nos olhos
Mesmo doente
e cansado mantiveste-te firme a meu lado
Obrigando-me, à força, a ter de ser eu a deixar-te
E assim
ficares… viúva…
Se gostei de
ti, vida?...
Tanto,
tanto, que me falt _________________________________________
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