sexta-feira, 27 de junho de 2014

Morfeu

Meu despertar foi hoje diferente
Fez parte do meu sonho recorrente
Um toque, uma mensagem
De repente…
Um sorriso, a paz
O regresso ao sono dolente
Assim foi hoje…
Aconteceu…

Prossigo a minha viagem
Aconchego-me nos braços de Morfeu

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quinta-feira, 26 de junho de 2014

Presente envenenado

Dão-nos um nome e um número
Comprido, e logo ao nascermos
Roubam-nos o sonho e a identidade
Obrigando-nos a crescer incógnitos
E sem esperarmos, num dado momento
Donos de nós, que falsidade
Pois, injustiçados há muito, 
Ainda nos acusam de havermos pecado

Em jeito de redenção, acendem-nos o paraíso
Mas servem-nos o inferno já apagado
Exploram-nos anos e anos, a fio
Humilham-nos e esquecem-se de nós
Sempre que decidem ser necessário
Chupam-nos o tutano, impõem-nos desafios
Decretam que somos precisos, mas mostram-nos o contrário!
Manipulam-nos e aligeiram-nos a idade

Querem-nos jovens até bem tarde
Impedem-nos o que seria o descanso merecido
Prolongando-nos por mais meia vida a meia-idade
Matam-nos a alegria e ficam-nos com a liberdade
Já perto do fim, adiam-nos o fim e a felicidade
De vez em quando usam-nos
Passeiam a nossa velhice pela avenida
Num cortejo onde a mentira se confunde com a verdade

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Alva aparição

Quando surges assim toda de branco
Minha vida é verdadeiro contraste
Logo fico rendido a tanto encanto
Quadro belo, obra-prima que pintaste

Impossível decifrar a tendência
Muito menos a técnica aplicada
É teu fascínio que faz a diferença
Comparado a qualquer tela pintada

E ao projetares em mim  teu talento
Socorro, fico cego e nada vejo
Por magnetismo os olhos lá se encontram

Presente e futuro se confrontam
E pr’a uni-los há um longo beijo
Prova de amor no céu e firmamento

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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Ilusão

Como se de repente
Já nada fizesse sentido
Como se os afectos outrora reais
Nunca tivessem existido
E a pele confundisse as memórias
Do que afinal apenas foi imaginação
Tão fértil ao ponto de nos baralhar
Deixando-nos convencidos de que tal aconteceu um dia

Como se de repente
Já nada fosse o mesmo
Como se a própria vida nos negasse o direito a recordar
Aquilo que afinal nunca existiu
E as marcas desse falso tempo provocassem uma espécie de reacção alérgica
A um vírus contagiante que nos consome
Mantendo-nos perdidos, distantes, na plácida busca
De um passado por cumprir num qualquer dia futuro

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terça-feira, 17 de junho de 2014

Ah pés para que vos quero!?...

Gosto de pés!
Dito isto, é bom que me explique.
Desde bem pequeno que assim é e, ao longo dos anos, refinei este meu gosto.
Para isso, contribuiu o Carlos, meu professor de desenho, corria o ano 1979.
A malta estava abismada com o seu discurso. Nunca ninguém tinha abordado tal tema, assim, em público, mais a mais tratando-se de uma aula de desenho (!?...)
O Carlos, mais do que um simples professor de desenho, era nosso amigo e preocupava-se com a abertura das nossas mentes, confrontando-nos constantemente com a importância do belo, do absurdo, das ideias pré-concebidas e o desafio que era olharmos o mundo com olhos diferentes e imaginativos.
Falava ele, nesse dia, da importância que tem a beleza de um pé na harmonia e equilíbrio estético do corpo.
Aquilo tocou-me! Aquela conversa era tudo aquilo que eu pensava mas que nunca tinha tido a coragem de revelar!...
Praticamente, toda a turma riu.
Alguns colegas, riram demonstrando algum nervoso miudinho, incomodados com o assunto e certamente, alguns deles, encolhendo os pés…
- Devem ter os pés feios… - pensei.
Mais tarde, confirmei alguns casos.
- Ai, os meus são esbeltos – disse o Picaluga, o mais velho da turma, calçando talvez, já naquela altura, o 42, provocando uma gargalhada na Xani.
As outras raparigas, essas, ficaram caladas, incomodadas com o tema da conversa, quase  que reveladora, ou, pelo menos, criando curiosidade relativamente à intimidade de cada uma.
Desde então, passei a não ter qualquer escrúpulo em revelar esse meu gosto e, inclusivamente, passei a olhar para os pés com mais respeito e exigência, convencido de que faço parte de um grupo reduzido de pessoas abençoadas pelo facto de terem a sensibilidade de apreciar a beleza no seu todo. E se o conjunto pode ser revelador de uma beleza homogénea, o pormenor pode fazer toda a diferença…
Penso que é injusto menosprezar-se a beleza dos pés, não lhes concedendo o mesmo protagonismo das mãos, olhos, cabelo ou boca, todos eles responsáveis pela harmonia e elegância do corpo, para além de que também os pés podem desvendar muito da personalidade de quem os transporta, ou de quem por eles é transportado.
Descartá-los, minimizá-los, desprezá-los e, sobretudo, ignorá-los, revela insensibilidade, superficialidade, por vezes, insegurança e até medo…
Gosto do verão, gosto de sandálias, gosto de pés bronzeados, tratados, elegantes e, às vezes, atrevidos, nús… 
Gosto de ver pisar como quem beija ou acaricia o chão e gosto dos movimentos que um pé pode desenhar ao alongar-se, dedos tensos, solas contraídas, calcanhares no ar, bicos de pés. 
No entanto, pés feios merecem também a minha admiração. Tome-se como exemplo os pés das bailarinas e bailarinos, dos desportistas, os pés de quem trabalha descalço e os usa como ferramenta. Pés macerados, castigados, mas sobretudo, honestos, verdadeiros, de quem não teve tempo para cuidar devidamente deles...
Além de tudo, os pés estabelecem o  contacto com o chão. 
Eles são testemunhas do peso que exercemos sobre este planeta e prova sofrida da nossa existência neste deambular constante. Através deles recebemos e utilizamos a energia emanada pela terra mãe.
Os pés descodificam essa energia e não mentem… Os olhos e a boca podem fazê-lo!
Assim, bem que o ditado podia ser:
- Mostra-me os teus pés e dir-te-ei quem és…

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segunda-feira, 16 de junho de 2014

Aqui deste lado

Olho bem de cá para lá
Mar de gente aqui defronte
Barcos dormem sobre o Tejo
À esquerda banha-se a ponte

Corpos deitados na areia
Abraçados e em segredo
Lábios juntos dão um beijo
Trocam línguas sem ter medo

Há um avião que risca o céu
Vai alto, não sei p’ra aonde
Já sumiu e não o vejo
Carros passam pela ponte

E então pego na caneta
Repouso os olhos no rio
Harmonia é o que eu vejo
Tento escrever e sorrio

Olho bem de cá para lá
Olhos meus que no passado
O fizeram com o desejo
De morar cá deste lado

Quedo-me assim eu tranquilo
Pois que um dia algo me diz
Haver de novo o ensejo
De tornar a ser feliz

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domingo, 15 de junho de 2014

Olh'os Cabrais!

O país está cheio deles
São tantos, todos iguais
Na essência por demais reles
Conhecidos p’los Cabrais

Com mais ou menos folclore
Passeiam-se convencidos
Que sabem tudo de cor
Sendo por todos queridos

Gostava tanto de os ver
Nem que fosse por um dia
Humildes e a aprender
Que a arrogância só vicia

E que é estúpida a canseira
De fingir ser diferente
Que de uma ou de outra maneira
É-se igual a toda a gente

São os Reis dos Carnavais
Que se julgam superiores
E embora iguais aos demais
São na verdade piores

Mas a vida que é tão sábia
Há-de um dia os acalmar
Que esta coisa de ter lábia
Basta apenas aguardar

De repente tudo muda
Obrigando a engolir
Tudo o que a língua bicuda
Se fartou de retorquir

Que a essência das pessoas
É às vezes bem ingrata
Eu cá prefiro a das boas
Que a das outras já me farta

Mais não tenho p’ra dizer
Poderia no entanto
Falar-vos do meu sofrer
Com todo este desencanto

Há-de o futuro ditar
O caminho a quem por mal
Gosta aos outros de afirmar
Que a eles não é igual

Vai-se assim a pretensão
Toda ela água abaixo
Resta-nos a convicção
Que os Cabrais são um fogacho

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Papoilas IV

Aguarela s/ papel - 2014

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Condições

Se o mar não se zangar
E a terra não tremer            
Se a guerra não rebentar
O sangue não se derramar
Nem a doença aparecer
Se a morte não vingar
Se o medo não voltar
E o barco não virar
Se a vida assim se revelar
É muito bom…

Mas,
Se um livro eu puder ler
Um poema conseguir escrever
Com um desenho a ilustrar
Se o teu nome eu souber cantar
E assim o teu sorriso eu obtiver
Se o tempo deixar
O meu amor se expressar
E se tu assim quiseres
Então,  melhor ainda…

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Conversas que têm olhos

Gosto de conversar
Conversas que têm olhos
Contigo, quero fazê-lo
Cá estou para te escutar
Juntos, dobamos esse novelo

Gosto de conversar
Conversas que têm olhos
Comigo, guardo segredo
Basta-me apenas o teu olhar
Juntos, não temos medo

Gosto de conversar
Conversas que têm olhos
É tão fácil, pode ainda ser melhor
E tudo aquilo que preferires calar
Não faz mal, sabes que o sei de cor…


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Já vai passar

Nada de preocupações comigo
Felizmente sou dos que amam rir
Conquanto às vezes também chore
Bastando para tal apenas sentir
O triste sofrer de um amigo
Aí, rezo para que tudo fique melhor…

E durante o tempo que medeia
O início e o fim de tal sofrimento
O remédio certo é o silêncio
Que ao provocar um certo torpor
Tal estado de confusão bloqueia
Devolvendo aos poucos o sorriso intenso…

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Ironia herege

Bastava um gesto teu…
E eu, como que por ironia,
Aceitaria a tua ausência
Confortando-me com a heresia
De alguma vez haver sonhado
Que o teu amor, por um instante
Poderia ser meu,
Só meu…
Nem que o fosse apenas...
Tão somente 
Tão somente só...
Apenas por um dia…

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sábado, 7 de junho de 2014

Jogo

Aceito o jogo e já nem sequer minto
Abraço o meu amor e jogo fundo
Revivo o meu passado, ai como o sinto
Redondas são as voltas deste mundo

E a cada reboleta das que ele dá
Pensar que a própria vida tudo ajeita
Reinventa novos rumos e já está
Levando-nos a crer que é tão perfeita

E se não fora pois desta maneira
Talvez minha alma assim não se entregasse
Tranquila a este amor, a tal cegueira

Preferindo viver desconfiada
Cortando a vasa a quem trunfo lançasse
Decidindo por fim sua jogada

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